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Disputa pelo mercado ‘verde’ de veículos chega à reforma tributária; entenda

Produtores de etanol saíram em defesa do governo Lula (PT) na última semana, após críticas da montadora chinesa BYD à proposta do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) de inclusão dos carros elétricos no rol de bens e serviços sujeitos à aplicação do imposto seletivo, uma das inovações da reforma tributária.

Em entrevista ao Estadão, o presidente do Conselho da BYD Brasil, Alexandre Baldy, que foi ministro de Michel Temer (MDB), disse que “existem vários governos dentro do mesmo governo”, e classificou como “retrógrada” a pasta chefiada pelo vice-presidente da República, Geraldo Alckmin (PSB).

A preocupação da BYD é que o imposto desestimule esse mercado. A chinesa anunciou em março aumento na previsão de investimentos no Brasil para R$ 5,5 bilhões. Seu desembarque na Bahia contou com articulação do governo federal, com aval do ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT).

Em reação aos comentários de Baldy, a Bioenergia Brasil e a Unica (União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia) circularam uma nota onde “consideram injustas” as manifestações contra a abordagem do governo brasileiro à mobilidade sustentável.

“Ao dizer que existem vários governos, a mensagem sugere a inexistência de coordenação por parte do Presidente da República. Vindo de uma empresa brasileira seria ruim; de uma estrangeira soa hostil”, diz o grupo do setor de etanol.

E cita o programa Mobilidade Verde (Mover), sancionado na semana passada, como um exemplo de política que “leva a sério” a descarbonização automotiva, medindo as emissões dos veículos em todo o ciclo produtivo.

Em jogo está a inserção da metodologia que avalia todo o ciclo de vida de produção de veículos e combustíveis nas políticas setoriais de incentivo. Herdada do Renovabio e explorada no Mover e no Combustível do Futuro, as análises do “poço à roda” e “berço ao túmulo” podem ser absorvidas pelo imposto seletivo.

No topo disto está uma disputa comercial pelo mercado brasileiro de veículos. A China vai ganhando espaço para seus elétricos e acendendo alerta nas montadoras e indústrias de biocombustíveis instaladas aqui. Disputa que o “berço ao túmulo” chega com a promessa de equilibrar.

IS para carros elétricos
De acordo com a versão atual do texto do PLP 68/24, que regulamenta o novo sistema tributário, aprovado por meio da PEC 132/23, no ano passado, prevê que veículos movidos exclusivamente a baterias elétricas estão isentos do imposto seletivo (IS), cuja intenção é reduzir o consumo de produtos considerados nocivos à sociedade.

A isenção veio do Ministério da Fazenda, de Fernando Haddad. O MDIC, no entanto, tem uma visão diferente e apresentou uma proposta alternativa ao grupo de trabalho formado na Câmara dos Deputados para analisar o PLP 68/2024.

Para atingir a finalidade do IS, de acordo com a ótica do MDIC, faz sentido apostar em uma sistemática de “bônus e malus” na aplicação do tributo à indústria automotiva, seguindo a lógica do IPI Verde do Mover.

Em tese, os veículos que atenderem aos requisitos de segurança, tecnologia, eficiência energética e pegada de carbono ganharão um bônus em relação à alíquota base do seletivo, o que significaria uma carga menor para os 100% elétricos, caso eles entrem no rol de taxação do IS.

Mas a indústria automotiva avalia de outra forma. Para a Anfavea (associação do setor), por exemplo, o novo imposto, ao restringir o acesso dos consumidores aos automóveis novos, irá atrasar a renovação da frota, e é contraditório em relação ao recém lançado programa de incentivo à inovação na produção de veículos, o Mover. Leia na cobertura de Hanrrikson de Andrade

O próprio setor de etanol é crítico à medida, no que diz respeito aos carros flex. Em uma outra nota divulgada na segunda (1/7), a Unica observa que a medida, além de ir em direção contrária ao Mover, estaria em desacordo com o Renovabio, ao desincentivar a tecnologia que permite abastecer com gasolina ou etanol.

Ganhando mercado
Dados da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE) apontam que a participação dos eletrificados sobre o total das vendas domésticas de veículos leves (de todos os tipos de combustível) tem se mantido constante, em torno de 7% a 8%, desde o início de 2024. Na primeira metade de 2023, esse market share era de 3,9%.

De janeiro a maio de 2024, o mercado brasileiro emplacou 64.908 eletrificados leves – aumento de 149% sobre o mesmo período em 2023.

Com mais de 285 mil eletrificados em circulação no país (0,25% da frota brasileira), a ABVE estima que este mercado atingirá a marca simbólica de 300 mil unidades nas ruas na virada do segundo semestre.

No topo do ranking de vendas está a BYD, com mais de 27 mil emplacamentos, seguida pela chinesa GWM (9,9 mil) e a japonesa Toyota (8,9 mil). Ainda de acordo com a ABVE, só as duas montadoras chinesas apresentaram ao mercado 18 modelos novos em 2024, sendo 16 deles elétricos plug-in.

A importação em massa de veículos chineses motivou uma carta da Afavea a Lula pedindo alíquota máxima de imposto de importação e cotas para entrada de carros elétricos no Brasil.

Elétrico só se for com etanol
No mundo, a previsão é que as vendas de veículos a combustão já atingiram o pico. Essa mudança na frota preocupa a indústria de biocombustíveis, que se articula para emplacar uma terceira via: a hibridização.

No início do ano, uma cooperação de produtores de etanol e biometano com montadoras como BYD, Stellantis, Volkswagen e Toyota publicou um estudo onde defende políticas de estímulos aos veículos elétricos híbridos (HEVs, na sigla em inglês), que associam eletrificação com motores a combustão.

O trabalho liderado pelo economista e ex-presidente do BNDES nos governos do PT (2007-2016), Luciano Coutinho, conclui que a maior adoção de HEVs é mais eficiente na redução das emissões de gases de efeito estufa (GEEs) e agregação de valor à indústria nacional, quando comparada com a predominância de veículos 100% elétricos (BEVs, na sigla em inglês).

 

Autor/Veículo: Epbr