A entrada dos Estados Unidos no conflito entre Israel e Irã e um possível fechamento do Estreito de Ormuz, que levou o preço do petróleo a um novo nível, podem fazer o valor do barril saltar para mais de US$ 100. Mas, segundo analistas, enquanto o petróleo se mantiver na casa dos US$ 80, a Petrobras consegue suportar a pressão externa por cerca de quatro semanas sem precisar repassar preços ao consumidor e, ainda assim, preservar a geração de caixa.
No fim de semana, a commodity (matéria-prima em dólar) atingiu US$ 80 o barril, com o parlamento iraniano votando a favor de bloquear o Estreito de Ormuz, por onde passa de 20% a 25% do suprimento mundial de petróleo por via marítima e que serve de rota para exportações de diversos países do Golfo. Analistas internacionais, como do banco Barclays, sugerem que o petróleo poderia subir para mais de US$ 100 por barril.
Entre os especialistas brasileiros, as projeções indicam a commodity em nível inferior a esse, o que permite à estatal brasileira continuar praticando preços abaixo do mercado internacional caso a decisão seja por fechar parcial ou totalmente Ormuz, avalia Flávio Conde, responsável pela área de pesquisa da Levante Investimentos.
“Mesmo no caso do diesel, que é a maior preocupação do mercado, já que importamos 25% do que é consumido, a Petrobras aguenta até um mês e meio de defasagem de preços sem grandes impactos por ser uma empresa eficiente. Não será por isso que deixará de pagar dividendos.”
Além disso, a política da estatal de não repassar a volatilidade, como a observada em tempos de guerra, “é apoiada pela decisão do governo de ter proximidade com a Rússia, o que garante a importação de produtos russos abaixo dos preços internacionais”, complementa.
Frederico Nobre, gestor de investimentos da Warren, também considera que a maior petroleira do País tem margem para suportar uma defasagem de preços de até quatro semanas.
“Se por um lado o Brent faz pressão, por outro o câmbio ajuda, com a valorização do real em cerca de 12% no ano. A Petrobras continua sendo uma boa tese de investimentos de médio e longo prazo, dadas as perspectivas de produção, do baixo custo de extração e da resiliência no cenário de preços da commodity mais baixo (US$ 65-70/barril)”.
Na quarta-feira, 18, durante coletiva para falar do primeiro ano de gestão à frente da estatal, a presidente da empresa, Magda Chambriard, comentou que o cenário (de petróleo em alta por conta do conflito Israel-Irã) é “bem recente” e que, por enquanto, a empresa ainda não agirá sobre os preços.
“Olhamos tendências e só fazemos movimentos quando enxergamos tendência e uma certa estabilidade. Vamos aguardar e continuar de olho no nosso mercado”, disse.
Entre as petroleiras menores, a Levante vê a Prio mais bem posicionada para capturar os ganhos do atual cenário de volatilidade, por vender petróleo perto dos preços do mercado internacional. “Brava e PetroRecôncavo vendem abaixo, por estarem mais expostas ao mercado interno, inclusive vendendo para Petrobras”, avalia Conde.
A Warren também cita a Prio como preferência, independentemente da recente alta do petróleo. “O setor é um vetor de crescimento no Brasil, a empresa foca na exploração e produção de petróleo em campos maduros nos quais a Petrobras não se interessa mais. É uma empresa que cresce a produção e tem perspectivas muito boas para 2025 com baixo custo de produção.”
Impacto do petróleo na inflação
Na avaliação de Mônica Araújo, estrategista de Alocação da InvestSmart XP, ainda que a inflação de curto prazo possa refletir em alguma medida os preços praticados pelo mercado internacional desde o último dia 13 de junho aos países importadores, como é o caso do Brasil com petróleo e alguns derivados (diesel e querosene de aviação — QAV), a expectativa é de manutenção das taxas de juros entre os bancos centrais até que haja maior clareza dos impactos do conflito.
“Mesmo que haja um aumento dos riscos, se os produtores de petróleo estiverem conseguindo escoar a produção e os consumidores estiverem conseguindo receber o que precisam, a tendência é de que haja uma acomodação no preço do petróleo. E, na medida que o evento seja solucionado, é provável que haja uma queda forte, fazendo com que a commodity volte a flutuar de acordo com oferta e demanda”, afirma.
Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research, também avalia que, apesar da possibilidade de um escalonamento futuro do conflito, esse movimento não deve influenciar as decisões dos bancos centrais no curtíssimo prazo.
“Um bloqueio total de Ormuz tem baixa probabilidade, mas se viesse a ocorrer, a China, que é importadora da região, seria diretamente afetada por qualquer interrupção. Por enquanto, os eventos recentes são choques de curtíssimo prazo. Os fundamentos do mercado no médio prazo continuam, com a ampla oferta liderada por países fora da Organização dos Países Exportadores de Petróleo e aliados (Opep+)”, avalia.
No entanto, para Seema Shah, estrategista-chefe global da Principal Asset Management, que atua no Brasil como gestora de fundos, no cenário mais negativo — uma interrupção completa do fornecimento de petróleo iraniano e o fechamento do Estreito de Ormuz — as prováveis consequências de tal interrupção seriam muito difíceis de mitigar completamente, mesmo com a Opep+ com capacidade ociosa e a produção americana tendo flexibilidade para aumentar, o que pode compensar parte das pressões de alta nos preços.
Além disso, Shah lembra outros exemplos. Nas duas Guerras do Golfo, o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) não aumentou juros, e o cenário econômico permaneceu sólido.
Em outra. situação, os ataques de drones à petroleira Saudi Aramco em 2019, realizados pelo Irã e outros países, desencadearam apenas uma breve alta nos preços do petróleo. Os dois casos ilustram a dificuldade de prever a trajetória dos mercados de energia a médio prazo, mesmo diante de choques geopolíticos significativos, analisa Shah.