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Selic deve subir hoje a 11,25%, e mercado já conta com novas altas

É praticamente unânime no mercado a expectativa de que o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central vai anunciar hoje um aumento de 0,5 ponto porcentual para a Selic, para 11,25%, conforme pesquisa do Projeções Broadcast. Mas, em meio ao aumento das desconfianças em relação ao risco fiscal – que fez, por exemplo, o dólar disparar nas últimas semanas –, há muitas dúvidas sobre os próximos passos da política monetária. Analistas têm falado em juros cada vez mais altos para que o BC consiga trazer a inflação para a meta.

Enquanto o mercado espera por um pacote de cortes de gastos (mais informações na pág. B3), o temor fiscal levou a uma piora nas variáveis observadas pelo Copom desde a última reunião, em setembro. O dólar, por exemplo, saltou de R$ 5,60 para a casa de R$ 5,80.

No relatório Focus, uma compilação do BC das principais previsões do mercado financeiro, a mediana para a taxa Selic no fim do ciclo de alta passou de 11,5%, em 13 de setembro, para 12,5% no boletim divulgado na última segunda-feira. Mesmo assim, a projeção para a inflação acumulada em quatro trimestres até o segundo trimestre de 2026 continua em trajetória ascendente: de 3,81% para 3,86% – distante do centro da meta de inflação, de 3%.

“A grande questão nesta reunião (do Copom) é entender até onde o BC vai”, diz o ex-diretor de Política Monetária do BC Luiz Fernando Figueiredo, hoje chairman da Jive Investments. “Antes, se imaginava que ele iria até 12% ou 12,5% (para a Selic). Mas, com esse cenário de desemprego muito baixo, crescimento forte e dólar alto, parece que talvez a gente tenha de ir para 13% ou 13,5%. Ele (BC) provavelmente vai deixar claro, no comunicado, que vai ter de ir mais longe do que se pensava inicialmente.”

A explicação para esse ciclo mais longo, segundo Figueiredo, é a política fiscal expansionista e a incerteza sobre quando o crescimento dos gastos públicos vai desacelerar. Nas últimas semanas, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, e outros membros do Copom deixaram claro em eventos públicos que o ceticismo do mercado quanto ao futuro das contas públicas tem adicionado prêmios nas expectativas e nos preços de ativos, e que será necessário um “choque fiscal positivo” para reverter esse movimento. “O BC só reage. O BC não é protagonista, ele é passageiro”, diz Figueiredo.

COMUNICADO. O estrategistachefe da Warren Investimentos, Sergio Goldenstein, espera que o BC suba o tom dos seus comentários sobre a importância da política fiscal no comunicado de hoje. Ele explica que, desde que o Copom começou a aumentar a Selic, o movimento tem sido o oposto do que se espera em um ciclo de aperto: inclinação da curva de juros no mercado futuro, desvalorização do real e aumento das inflações implícitas (a expectativa de inflação futura embutida nos juros dos títulos vendidos no mercado). Sem o auxílio da política fiscal, a política monetária fica impotente para reverter essa situação.

“Se vier um pacote (de corte de gastos) muito bom, ao longo do tempo isso levaria a um ciclo muito menor do que o precificado pela curva (de juros futuros)”, diz o analista, lembrando que os juros futuros indicam hoje um aumento da Selic para patamar entre 13,75% e 14% no fim do ciclo de alta. A Warren espera uma taxa de 12,5% no fim do ciclo, contando com uma desaceleração da economia e redução dos prêmios de risco ao longo do ano que vem.

Já o economista-chefe do Banco BV, Roberto Padovani, diz que toda a evolução do cenário nos últimos 45 dias aponta para aceleração do ritmo de aperto monetário a 0,5 ponto hoje. Ele espera um ciclo total de 2 pontos porcentuais de alta, o que levaria a Selic a 12,5%. Mas também defende que o BC evite sinalizar um teto para a taxa, em meio às incertezas no cenário. •

“A grande questão nesta reunião é entender até onde o BC vai. Antes, se imaginava que ele iria até 12% ou 12,5%. Mas, com esse cenário de desemprego muito baixo, crescimento forte e dólar alto, parece que talvez a gente tenha de ir para 13% ou 13,5%” Luiz Fernando Figueiredo,

Ex-diretor de Política Monetária do BC e chairman da Jive Investments

Ex-diretora do Banco Central, Fernanda é chefe de pesquisa macroeconômica para América Latina do BNP Paribas

“Não vemos notícias positivas para o Banco Central até o final do ano, com a grande exceção do possível anúncio do pacote de contenção de gastos”

Ex-diretora do Banco Central e hoje chefe de pesquisa macroeconômica para América Latina do BNP Paribas, Fernanda Guardado calcula que a taxa básica de juros terá de ir a 12,75% ao ano para que o BC consiga levar a inflação à meta de 3% “em meados de 2026”. Na revisão de cenário divulgada na semana passada, o banco passou a prever quatro altas seguidas de 0,50 ponto porcentual para a Selic. Hoje, a taxa está em 10,75% ao ano. Em seu último encontro, o Comitê de Política Monetária (Copom) promoveu uma alta de 0,25 ponto porcentual – no primeiro aumento do terceiro mandato do governo Lula. A seguir, os principais trechos da entrevista:

Como a sra. analisa a economia brasileira no atual momento? O crescimento surpreende, mas os ativos estão bastante deteriorados.

A economia tem apresentado um dinamismo surpreendente. Começamos 2024 com uma projeção de crescimento de 2%, e revisamos para 3%. Esse é o quarto ano consecutivo em que não apenas nós, mas a maior parte dos analistas econômicos – e até o próprio BC –, estamos revisando para cima as projeções. Os indicadores mais recentes que temos recebido mostram que esse dinamismo persiste. É uma notícia muito positiva ver o Brasil crescendo dessa maneira, mas há um lado preocupante, porque é um crescimento que se dá acima do potencial de crescimento da economia. E isso tem o potencial de manter acesos os riscos inflacionários.

E a preocupação com a questão fiscal e a expectativa pelas medidas de corte de gastos?

De fato, os riscos em relação ao cumprimento das metas fiscais, principalmente para 2025 e 2026, têm impactado negativamente os preços de ativos. Não são apenas as dúvidas em relação ao atingimento da meta, mas as diversas notícias e iniciativas que foram observadas nas últimas semanas que trabalhavam no sentido de maiores gastos, em um ambiente em que as metas fiscais são vistas como bastante desafiadoras e a trajetória da dívida/PIB também é muito desafiadora. Todas as notícias que traziam novas propostas de gastos – meritórias ou não – acabavam tendo esse impacto muito negativo na precificação dos ativos e na própria curva de juros do mercado, por conta desse questionamento sobre se haveria ou não alguma consolidação fiscal no horizonte.

E o governo consegue cumprir a meta fiscal deste ano?

Em 2024, o governo se aproxima da banda inferior. Ainda temos dúvidas se eles atingirão a banda inferior da meta fiscal, mas, para o ano que vem, nós vemos um cenário bastante desafiador.

Por quê?

Nós acreditamos que a arrecadação será mais baixa do que aquela que foi enviada no Orçamento. Além disso, não está claro se a meta de poupança do governo com a contenção de fraudes vai de fato se verificar naquele tamanho. Por isso, essa notícia de um anúncio de um ajuste fiscal (o governo estuda limitar as principais despesas do Orçamento a um crescimento real de 2,5% ao ano) vai ser muito bem-vinda. Se o governo, de fato, anunciar um pacote nesse sentido, acho que tem o potencial para diminuir um pouco essa desconfiança em relação ao futuro da política fiscal. É importante ver iniciativas nesse sentido, da contenção do crescimento dos gastos, principalmente quando se observa que algumas linhas do Orçamento, como a de gastos obrigatórios, têm crescido bastante acima da inflação.

Mas há algum tipo de exagero na reação do mercado? Vimos, por exemplo, os juros futuros subindo a patamares muito elevados.

É sempre difícil fazer essa avaliação sobre se os prêmios estão excessivos ou não. Os prêmios vão refletir a aversão maior ou menor ao risco que as pessoas que financiam a dívida pública estão dispostas a correr. Então, diante desse cenário em que ocorreram diversas propostas e iniciativas de maiores gastos, já num ambiente de percepção de que a dívida pública vai crescer de forma muito forte, é de se esperar que haja um aumento do prêmio pedido para horizontes mais longos na dívida pública. É o que é. O mercado é o que é.

E como fica o BC nessa história? Quais serão os próximos passos?

Já há bastante tempo, projetamos que o BC, nessa reunião de novembro (hoje), vai acelerar o ritmo (de alta) para 0,50 ponto porcentual. Acreditamos que eles vão fazer isso em novembro e em dezembro para garantir, com esse ritmo um pouco mais forte, que a política monetária aja no tempo hábil para trazer a inflação de volta para a meta em meados de 2026. Nós víamos que o ciclo continuaria até março. E nós ainda vemos. Mas agora esperamos que esse ritmo de 0,50 se repita também em janeiro e em março. Portanto, nós estamos revisando para cima a nossa Selic final para 12,75%.

Isso é suficiente para trazer a inflação para a meta em meados de 2026?

Isso, no terceiro trimestre de 2026. No modelo, é suficiente. Mas, agora, sempre há condicionantes importantes por trás dessa projeção. Uma das condicionantes é que se parte do nível atual de câmbio, sem depreciações adicionais, além do que é o usual para esse tipo de exercício. Não vemos notícias positivas para o Banco Central até o final do ano, com a grande exceção do possível anúncio do pacote de contenção de gastos. •

Fonte: O Estado de S.Paulo